Ai, minha flor! Eu fico meio pasmo com como ainda, em pleno século XXI, as pessoas são presas a velhos métodos. Sim, são sim. É um conservadorismo muito preguiçoso em que a gente vive, não é verdade? Mas acontece, minha flor, que essa desatualização toda também se reflete na religião. Ah, reflete sim, pense bem! Olha, eu vou te provar isso... Mas não pense que estou falando da Igreja Católica, porque sobre ela a gente nem fala – é, porque quando você pensa que ela está se atualizando, lá vem um balde de água fria que deixa tudo pior do que antes (camisinha que o diga, minha flor).
Eu quero falar mesmo é da desatualização de religiões até novas. É, minha flor, eu estou falando da macumba mesmo, que quase todo mundo vai atrás um dia pra pegar aquele namorado safado com a outra ou pra conseguir um marido safado pra si – ou você vai me dizer que isso não acontece? As batinas e as orelhas do padre que o digam, minha flor! Mas enfim, vamos à atualização – ou melhor à desatualização. Isso porque nem vou questionar se isso existe ou não, mas que o povo é chegado num ziriguidum...
Gente, pensem bem: se hoje já existem notícias de psicógrafos que falam com seus mortinhos por computador, imagine só o que os pais e mães de santo não podem fazer? O Chico Xavier só não usava computador porque estava velhinho e doente, e o computador não era algo que desse tempo de ele entrar em contato enquanto vivo. Mas os praticantes atuais já podem fazer uso da tecnologia.
Já imaginaram que chiquérrimo um despacho virtual? Você usa os elementos do Flash Player com desenhos em gif ou jpg e, minha flor, fica tudo lindo! Você não suja nem o terreiro, menos ainda seu vestido branco rodado! Fora que você vai fazer um bem à mãe-natureza. Ah, vai sim, minha flor! Vai evitar que pobres bodes e galinhas sejam sacrificados! O que vale é a intenção, não é verdade? Então, você pode fazer um sacrifício virtual do seu bodinho ou da sua galinha preta! Aí, nem o IBAMA, nem o PETA ou Greenpeace vão te atacar. E outros elementos também. Estamos em geração saúde, minha flor, pra que ficar tomando cachaça e fumando charuto? Faça a pinga da boa do orixá e um havano caríssimo e chiquérrimo no seu computador – ou melhor, no notebook! E quando estiverem mais disponíveis as projeções holográficas, querida... Affe! Vai ser um ritual lindo, com goles, baforadas, galinhas cacarejando, bodes berrando e T U D O sem sujeira, politicamente correto com a saúde, até a ANVISA vai ficar de queixo caído, minha flor!
Outra coisa que as pessoas precisam entender é que orixá também é gente. E, como seres elevados, têm bom gosto e refinamento sim! Os romanos e os gregos já sabiam disso há muito tempo, minha flor. Olha só os deuses deles: lindos, tesudos, chiques, poderosíssimos! Vá conferir os templos que restaram e você verá que eles eram importantes. E as pessoas entendiam isso, se não, não gastariam tanto pra agradar seus deuses. Agora, hoje, aqui no Brasil, as pessoas fazem cada coisa mixuruca pros seus orixazinhos... Dá dó, minha flor! Há um total desrespeito! Vem cá, bem, você acha que só porque eles são da África não gostam de coisas bem feitas? Preconceito dessa sociedade atrasada, minha flor! Muito chato! Querida, as pessoas ficam fazendo pedidos pra Iemanjá no réveillon, mandando oferenda, casinha, flor branca e tudo mais. Iemanjá, gente, é
uma moça ousada, de energia, com bom gosto! Você acha mesmo que com praias lindas no Taiti e no Hawaii, cheias de gente rica e bonita, ela vai baixar na Praia Grande? Ah, me poupe! Tudo bem que existe boa intenção das pessoas que fazem isso, mas, convenhamos, né, meus amores! Aquilo deve ir pra alguma sobrinha pequena da Iemanjá que adora brincar com as coisas da tia. Aquele batom do camelô, aquela pulseira que você comprou do cigano... por favor! Orixá não é burra! Iemanjá deve, no máximo, dar uma passeadinha em Fortaleza antes da meia-noite.
Outra coisa que poderiam atualizar é o local de onde deixar o trabalho. Primeiro que hoje já tem delivery suficiente pra poder mandar entregar o trabalho onde você quiser, basta dar uma telefonadinha que um motoboy atende prontamente! E o lugar deve ser escolhido já com as intenções do despacho, minha flor. Deixar em encruzilhada é furada, pode passar qualquer morto de fome e levar a panela pra casa e fazê-la de cesta básica. Olha só, por exemplo, se você quer arrumar um marido elegante, experiente, maduro e rico, você vai procurar deixar o seu trabalho em frente a uma empresa multinacional, em frente à concessionária da Ferrari, em frente ao City Bank ou ao Bank Boston. Se você deixar em frente ao Bradesco, minha flor, suas intenções não serão bem executadas. Quer um namorado sarado, malhado, com um corpão lindo, você vai deixar o trabalho em frente a uma boa academia, como a Formula Fitness e Bio Ritmo, e não na da D. Zuleide, que usa lata velha de tinta com concreto como peso de halteres. Ah, nesse caso, é só deixar também em frente a uma boate gay, minha flor, que os corpos são do mesmo estilo: sarados no ponto! Quer um marido fogoso, caliente, sensual e sexy, você tem que mandar seu despacho pra Espanha ou pra casa do Johnny Depp ou do Antônio Banderas. Uma outra opção, seria para um ponto de garotos de programa ou pra frente de uma produtora de filmes pornôs – boates gay também, minha flor. Agora, se você quer um cara inteligente, que te faça babar de tanto conhecimento, mande o trabalho pra USP ou pro Japão e já faça outro despacho pedindo o amante. E se você quiser um marido hétero, lindo, rico, experiente, sensual, sarado, inteligente e que a ouça, minha flor, pode mandar o trabalho pra porta da maternidade – sim, porque esse ainda está pra nascer!
Johnny Affe (amigo e consultor de estilo de Madame CoCo)